Jorge Guimarães
O setor de combustíveis em Divinópolis recebeu com entusiasmo a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que aprovou o aumento da mistura de etanol anidro na gasolina de 27% para 30%, a partir de 1º de agosto deste ano. A medida, que também eleva o percentual de biodiesel no diesel de 14% para 15%, visa fortalecer a produção nacional de biocombustíveis e reduzir a dependência de combustíveis fósseis.
Divinópolis
Em Divinópolis, empresários do setor afirmam que a medida pode trazer benefícios econômicos e ambientais, além de dar mais previsibilidade ao mercado.
— Esse aumento no percentual de etanol é benéfico para o país e para o consumidor. O etanol tem uma produção forte aqui em Minas, então é uma forma de valorizar o setor e, em alguns momentos, até baratear o custo final da gasolina — avalia Carlos Henrique Lima, gerente de um posto na região central da cidade.
Já Rafael Oliveira, gerente de um outro posto no bairro Nações, ressalta a importância da estabilidade nas regras.
— Quando o governo define esse tipo de mudança com antecedência e de forma gradual, nos ajuda no planejamento de compras e na adaptação da infraestrutura, especialmente no caso do biodiesel, que exige controle rigoroso de qualidade — pontuou Oliveira.
Dúvidas e cuidados
Apesar de elogios, a decisão está gerando repercussão não só entre empresários do setor de combustíveis, mas também entre consumidores e profissionais da área de manutenção automotiva em Divinópolis.
Se por um lado a medida é comemorada por seu potencial de reduzir a emissão de poluentes e valorizar os biocombustíveis produzidos no país, por outro, há quem se preocupe com os impactos mecânicos a médio e longo prazo.
O mecânico Leandro Souza, com mais de 10 anos de atuação no bairro Bom Pastor, explica que veículos mais novos, principalmente os flex, estão preparados para esse tipo de mistura.
— Quem tem carro flex não precisa se preocupar tanto. Esses motores já foram desenvolvidos para trabalhar com diferentes proporções de etanol e gasolina. Mas nos carros mais antigos, principalmente os que rodam muito, é bom ficar de olho na limpeza do sistema de injeção — alerta.
Diesel
Já no caso do diesel, a atenção é ainda maior, segundo o especialista em motores a diesel, Marcelo Tavares, que atua em uma oficina no bairro Icaraí.
— O biodiesel tem características diferentes do diesel fóssil. Ele pode aumentar a formação de borra e exigir mais cuidado com filtros e bicos injetores. Com a mistura passando para 15%, o ideal é antecipar a manutenção e seguir à risca o manual do fabricante — recomenda.
Consumidores
Entre os consumidores, as opiniões são diversas. A comerciante, do ramo de elétrica, Célia Moreira diz que não vê problema na mudança.
— Meu carro é flex, e sempre usei etanol na maior parte do tempo. Nunca tive dor de cabeça por isso. Se for para minimizar os custos, estou de acordo — afirma.
Já o caminhoneiro Renato Alves, que trafega com frequência entre o Centro-Oeste e o Triângulo Mineiro, demonstra cautela.
— Eu já tive problema com biodiesel no passado, com entupimento de filtro. Agora, com mais biodiesel, vou redobrar a atenção. Mas se a qualidade for garantida, tudo bem — pondera.
Estudos técnicos
Mas apesar do Ministério de Minas e Energia garantir que a decisão foi tomada com base em estudos técnicos e diálogo com montadoras, produtores e especialistas, e que os percentuais autorizados são seguros para a frota nacional.
— Ainda assim, recomendamos manter a manutenção em dia, principalmente agora que os combustíveis terão uma nova composição — finaliza Marcelo.
Valorização
Para o economista Leandro Maia, a medida representa um avanço estratégico na matriz energética brasileira e pode gerar efeitos positivos tanto para o mercado, quanto para o meio ambiente.
— A ampliação da participação dos biocombustíveis na composição final dos combustíveis fósseis é um passo importante. O Brasil é referência mundial na produção de etanol e biodiesel. Valorizar essa cadeia é também considerar o agronegócio, gerar empregos no interior e reduzir a dependência de derivados de petróleo — destaca.
Na avaliação do economista, os impactos para o consumidor final devem ser mínimos no curto prazo, especialmente em regiões como Minas Gerais, que têm forte produção de cana-de-açúcar e soja.
— Em estados como Minas, São Paulo e Goiás, há maior disponibilidade de etanol e de insumos para biodiesel. Isso ajuda a equilibrar os preços e evita pressões inflacionárias. O consumidor pode até sentir alguma variação no início, mas o efeito tende a se estabilizar — explica.
Maia também ressalta que a medida está em sintonia com a transição energética e o compromisso ambiental do Brasil.
— O mundo inteiro está buscando reduzir emissões de carbono. Aumentar a presença de etanol e biodiesel é uma forma limpa e imediata de contribuir com esse esforço global, sem depender de grandes investimentos em tecnologia ou infraestrutura – frisa.
Qualidade
Apesar dos elogios, o economista defende atenção à qualidade do produto final e ao monitoramento da logística.
— A mistura deve ser feita com rigor técnico, e o transporte e armazenamento precisam seguir padrões adequados para garantir a eficiência dos combustíveis e evitar prejuízos aos veículos — afirma Leandro.
Fiscalização
Apesar do otimismo com as novas diretrizes aprovadas pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), representantes do setor de combustíveis demonstram preocupação com a capacidade de fiscalização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
A principal inquietação é em relação à qualidade dos combustíveis vendidos nos postos, especialmente diante das mudanças na composição dos produtos. Com mais biocombustíveis nas bombas, aumenta a necessidade de controle rigoroso, tanto nas distribuidoras quanto nos pontos de revenda. No entanto, fontes do setor apontam que a ANP enfrenta limitações orçamentárias e operacionais que podem comprometer a eficácia da fiscalização.
— A medida é positiva do ponto de vista ambiental e econômico, mas é preciso garantir que o consumidor receba um combustível dentro dos padrões. A falta de estrutura da ANP para fiscalizar de forma ampla é um risco real — avalia o economista.
Maia aponta que o sucesso da nova política energética passa não só pela produção e distribuição dos biocombustíveis, mas também pela confiança do consumidor na qualidade do produto final.
— A confiança é essencial. E isso só se conquista com fiscalização efetiva e presença constante da ANP nas ruas — conclui o economista.
Enquanto a medida não entra em vigor, o setor aguarda um posicionamento mais firme do governo sobre o fortalecimento da estrutura da ANP, para que os benefícios dos biocombustíveis não sejam comprometidos por falhas no controle de qualidade.