Welber Tonhá e Silva
A vida é feita de ciclos. Às vezes, precisamos dar uma parada, respirar e recomeçar — seja do ponto em que paramos ou mesmo de um novo ponto, com destinos diferentes e rumos inesperados.
Recomeço minha coluna, depois de umas férias, escrevendo sempre sobre alguma cultura. E nada mais pertinente do que iniciar falando sobre a cultura de recomeçar algo na vida.
Recomeçar a vida é uma experiência profundamente humana e universal, presente em diversas culturas ao longo da história. A cultura do recomeço está associada à resiliência, à renovação e à capacidade de se reinventar diante das perdas, mudanças ou fracassos.
Abaixo, exploro esse tema em diferentes dimensões:
O recomeço como parte do ciclo da vida
Muitas culturas enxergam o recomeço como algo natural, ligado aos ciclos da natureza — como o nascer e o pôr do sol, as estações do ano e os rituais de passagem. O outono representa a perda; o inverno, o recolhimento; a primavera, o renascimento; e o verão, a plenitude. Essa visão cíclica nos ensina que tudo tem seu tempo, inclusive o tempo de recomeçar.
Religiões e filosofias que valorizam o recomeço
Religiões como o cristianismo, o budismo e o hinduísmo tratam o recomeço como algo sagrado.
No cristianismo, há a ideia de “renascimento espiritual”, em que o arrependimento pode levar a uma nova vida. No budismo, o desapego e o foco no presente são caminhos para recomeçar sem o peso do passado. O hinduísmo acredita na reencarnação como uma forma de evolução e recomeço eterno.
Rituais de recomeço nas culturas tradicionais
Em muitas sociedades indígenas, africanas e orientais, há rituais que simbolizam recomeços — como cerimônias de purificação, passagem ou iniciação. Essas práticas são formas simbólicas de deixar o passado para trás e se preparar para um novo ciclo de vida.
A cultura contemporânea e os recomeços
Hoje, em um mundo cada vez mais marcado por mudanças rápidas, a cultura do recomeço está presente nas histórias de superação: pessoas que mudam de carreira, reconstroem suas famílias, saem de relacionamentos abusivos ou enfrentam doenças. A narrativa do recomeço está fortemente presente em filmes, livros e músicas populares, que inspiram esperança e coragem.
O recomeço como ato político e social
Em contextos de guerra, migração ou catástrofes, recomeçar a vida se torna uma necessidade coletiva. Refugiados, sobreviventes e populações vulneráveis, muitas vezes, têm que reconstruir não apenas suas casas, mas também suas identidades e laços sociais. O recomeço, nesses casos, é também resistência.
Desafios emocionais e simbólicos de recomeçar
Embora necessário, recomeçar nem sempre é fácil. Implica abrir mão do conhecido, lidar com a dor, a culpa ou o medo. Por isso, a cultura do recomeço envolve também empatia, apoio coletivo e a valorização das pequenas conquistas. Recomeçar é, muitas vezes, um ato de coragem silencioso.
Frases e provérbios sobre recomeços
Frases como “nunca é tarde para recomeçar”, “onde uma porta se fecha, outra se abre” ou “todo fim é um novo começo” expressam essa sabedoria ancestral de que a vida não é uma linha reta, mas cheia de voltas e possibilidades.
Recomeçar é mais do que um ato; é uma atitude diante da vida. Está profundamente ligado à capacidade humana de sonhar de novo, refazer laços, reconstruir identidades e, principalmente, manter a fé no futuro mesmo diante do caos. Em toda cultura, o recomeço é símbolo de esperança e transformação.
Exemplos históricos de grandes recomeços
Muitos grandes nomes da história passaram por momentos de ruptura, fracasso ou transformação, e decidiram mudar radicalmente o rumo de suas vidas. Esses recomeços ajudaram não apenas a reconstruírem suas trajetórias, mas também a impactar profundamente o mundo.
Nelson Mandela
Antes de se tornar símbolo da luta contra o apartheid, Mandela foi advogado e líder político do Congresso Nacional Africano. Condenado por conspiração, passou 27 anos na prisão. Poderia ter saído amargurado, mas, ao ser libertado, escolheu recomeçar pela via do perdão e da reconciliação, tornando-se presidente da África do Sul e ícone global da paz e da justiça.
Mahatma Gandhi
Gandhi começou sua vida como um advogado tímido e inseguro na Inglaterra e na África do Sul. Porém, após enfrentar o racismo colonial, decidiu recomeçar sua trajetória como ativista político. Voltou à Índia e liderou um movimento de independência baseado na não violência (satyagraha), transformando-se em um dos maiores líderes espirituais e políticos da história.
Malcolm X
Antes de se tornar um dos maiores líderes dos direitos civis dos EUA, Malcolm X esteve envolvido com o crime e passou anos preso. Na prisão, teve um despertar intelectual e espiritual, estudou intensamente, converteu-se ao islamismo e recomeçou sua vida como ativista. Tornou-se um poderoso orador e símbolo da luta por igualdade e dignidade para os negros norte-americanos.
Leonardo da Vinci
Leonardo começou como aprendiz de pintura, mas sua curiosidade e desejo de conhecer o mundo o levaram a recomeçar várias vezes: foi pintor, engenheiro, inventor, cientista, anatomista. Seu espírito inquieto e renascentista mostra que recomeçar não é abandonar algo, mas expandir-se continuamente.
Maria da Penha
A brasileira Maria da Penha foi vítima de tentativa de feminicídio pelo marido, ficou paraplégica e teve que recomeçar sua vida emocional, física e social. Transformou sua dor em ativismo, lutando por anos até conseguir mudar a legislação brasileira com a criação da Lei Maria da Penha, marco no combate à violência doméstica no Brasil.
Frida Kahlo
Frida sonhava em ser médica, mas um grave acidente a deixou com sequelas permanentes. Durante sua longa recuperação, recomeçou sua vida na arte, canalizando sua dor física e emocional em obras que se tornaram referência mundial no surrealismo e no feminismo. Sua força e sensibilidade marcaram gerações.
Steve Jobs
Jobs foi demitido da própria empresa, a Apple, que havia fundado. Em vez de se acomodar, criou a NeXT e comprou a Pixar, que viria a se tornar um sucesso. Anos depois, voltou à Apple e revolucionou a tecnologia mundial com o iPhone, iPod e Mac. Ele mesmo disse: “Ser demitido da Apple foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido.”
Oprah Winfrey
Teve uma infância marcada por abuso, pobreza e racismo. Aos vinte e poucos anos, foi demitida de um programa de TV. Mas recomeçou, reinventou seu estilo e criou um império midiático, tornando-se uma das mulheres mais influentes do mundo, símbolo de superação e generosidade.
Esses exemplos mostram que recomeçar pode ser doloroso, mas também pode ser libertador. Muitas vezes, as grandes viradas vêm dos momentos mais difíceis — e é aí que surgem novas forças, ideias e caminhos. Essas figuras nos inspiram a lembrar que mudar de rumo não é fracassar, é evoluir.
E você? Já recomeçou em algum momento da sua vida?
Me conte!
Tem pauta sobre alguma cultura?
Envie para: [email protected]
Welber Tonhá e Silva
Imortal da Academia Divinopolitana de Letras – Cadeira nº 09
Imortal da Academia de Letras e Artes Luso-Suíça em Genebra – Cadeira nº C186
Membro da Academia Mineira de Belas Artes
Historiador, Escritor, Pesquisador, Fotógrafo e Fazedor Cultural
Instagram: @welbertonha
