Não amanhece um dia neste país sem que o noticiário tenha registrado mais uma tragédia nas rodovias brasileiras. Famílias destroçadas, vidas e sonhos interrompidos — um ciclo perverso que se repete com a previsibilidade dos que já perderam a capacidade de se chocar. E o que se vê é uma sucessão de tragédias tratadas com indiferença, de uma banalidade rotineira. Apenas no fim de semana, ao menos sete acidentes graves mataram 15 pessoas nas rodovias federais e estaduais de Minas Gerais. 

Grande parte dessa triste realidade tem uma explicação que salta aos olhos: as péssimas condições das vias. A BR-494, que liga Divinópolis a várias cidades da região, é exemplo do descaso. Precária, estreita e trechos perigosos fazem da rodovia um convite constante ao desastre. Não é de hoje. Moradores, lideranças comunitárias e representantes políticos locais cobram, há anos, do governo federal a duplicação da via. E o que foi feito? Nada.

A duplicação virou uma promessa reciclada a cada ciclo eleitoral. E, agora, não por coincidência, às vésperas de mais um ano de eleição, surgem novas promessas de obras por parte do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). É um enredo repetido: muito discurso, pouca ação. E, enquanto a burocracia engatinha, o número de fatalidades só aumenta.

O paradoxo é ainda mais cruel quando lembramos que Divinópolis está prestes a ganhar o tão aguardado Hospital Regional — uma conquista importante, mas que já nasce ameaçada pela precariedade da rodovia que deveria garantir o acesso rápido e seguro à unidade de saúde. Que sentido faz investir milhões em saúde pública e deixar que os pacientes estejam em risco no caminho por falta de infraestrutura?

O prefeito Gleidson Azevedo (Novo), diante do número alarmante de acidentes em um dos trechos mais críticos da rodovia, tomou uma medida concreta: interditou o retorno conhecido por colisões. Mas, infelizmente, os acidentes continuam. Prova de que, além da má estrutura, há outro fator igualmente perigoso: a imprudência dos motoristas. O “nem aí da população”. Muitos ainda insistem em manobras arriscadas, ultrapassagens em locais proibidos e desrespeito aos limites de velocidade. A rodovia é perigosa, sim — mas parte da culpa também está atrás do volante. A tragédia nas rodovias é fruto de um conjunto de irresponsabilidades: do poder público que negligencia, e da população que, por vezes, desafia o bom senso. 

Estrada segura não pode ser promessa de palanque, tem que ser compromisso de governo e responsabilidade de todos. Até quando vamos esperar para levar essa pauta a sério? Quantas vidas ainda terão de ser perdidas para que deixemos de tratar a duplicação da 494 — e tantas outras obras fundamentais — como uma carta de campanha e passemos a tratá-la como prioridade de sobrevivência?

E a 494 é apenas umas dentre tantas rodovias que cortam o país e seguem em estado precário, colocando em risco milhares de vidas. Não se pode contentar com o pouco, com o mínimo. O governo precisa ter capacidade de gestão para aplicar parte dos bilhões arrecadados em impostos na malha rodoviária. Principal meio de transporte do país.  Caso contrário, o discurso será sempre o mesmo: de que é preciso conceder à iniciativa privada e instalar pedágios para viabilizar as melhorias. É sempre o brasileiro pagando duplicado. Pagando para o governo manter e para a iniciativa privada cuidar. Isso porque a máquina pública segue inchada, mantendo benefícios e privilégios para os altos escalões, enquanto a dignidade da população é sacrificada e colocada em risco todos os dias. 

Não deveria, mas, no Brasil, é normal.

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